Quem, como eu, vai de carro para o trabalho todos os dias, sabe que é mais provável ganhar o euromilhões e o totoloto na mesma semana que conseguir fazer uns quantos kms em percurso urbano sem ouvir impropérios, dirigidos ao próprio ou a outros.
Seja porque se arranca mais tarde no semáforo, ou porque se quer mudar de faixa de rodagem, ou porque se pára na passadeira para deixar passar uma velhinha, há sempre um energúmeno logo atrás, com a mão colada na buzina e a cabeça de fora da janela, aos gritos, especulando sobre a actividade profissional da mãezinha do insultado.
Não há forma de escapar a esse chorrilho de repreensões ofensivas e injuriosas.
Faz tudo parte do culto do insulto em Portugal, actividade em constante expansão e desenvolvimento, empregue não só nas estradas, mas igualmente na rua, na praia ou nas filas de supermercado.
Tudo fruto da mesma falta de civismo que faz de Portugal o paraíso dos reboques e sucateiros.
Há, ao menos, uma coisa positiva no meio dessa falta de respeito pelo concidadão: uma total ausência de discriminação.
Seja homem, mulher, novo, velho, branco, preto, benfiquista, sportinguista, alto, baixo, gordo ou magro, todo o cidadão é passível de ser injuriado e apelidado de coisas feias, que nem sempre correspondem à realidade.
A mim, já me chamaram muita coisa na vida.
Curiosamente, um dos mais depreciativos insultos que recebi veio da minha própria Mãe, que me cognominou de "escravo da moda", quando, há uns anitos atrás, resolvi fazer um piercing.
Assim não vamos a lado nenhum.